segunda-feira, 21 de setembro de 2009

A boca de lobo - Terceiro fragmento

-Fico indignado quando um cara vem nos roubar... Porra! A gente rala pra caralho pra comprar as nossas coisas e vem um filho da puta e nos toma o pouco que conquistamos com o nosso suor! E pra piorar, ás vezes nos enche de porrada ou até nos mete bala até estourar nossos miolos proletários!
-Hum...
-Respeito aqueles que roubam bancos. Ali sim! Estão tomando aquilo que não afetará o homem cotidiano. Eu, você, sua velha... Esses não deveriam ser chamados de ladrões!
-Seria o que então? Revolucionário?

Éramos amigos. Amigos que despercebidamente passeiam em suas próprias mentes sem ao menos perceber, conectos que são. Dividir um pedaço de minha existência com ele, era como agregar para mim um pedaço maior daquilo que chamo de existência. Não dividíamos em suma, multiplicávamos. Mas o resultado era sempre indivisível. Éramos um. Não havia pudor em uma relação tão intensa quanto essa, apenas nudez. Nudez entre duas crianças. Um dia desses enquanto estávamos deitados sobre uma caixa d'água abandonada olhando para as estrelas e tomando uns tragos, ele meteu um cigarro direto no meu olho direito. Aquele calor era infernal, a dor indescritível, nem tive condições de fitar seu rosto silencioso que me encarava com uma indiferença perturbadora. Era como se uma rocha estivesse a me encarar. Não. Não tive a capacidade de fazer qualquer consideração acerca do que me rodeava. Era tudo eu, era tudo dor. Nessas ocasiões, primeiro vem o sofrimento físico, depois o sofrimento da alma. E agora, há tanto veneno em minha alma que as pessoas me confundem com um animal peçonhento. Tenho tanto veneno em minha alma que me tornei uma cobra.

I.B.

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