quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Love Story


“Você já viu um coração de verdade? Ele parece um punho fechado coberto de sangue!”

Havia esse homem que passava todos os dias de semana pela mesma rua à noite, quase no mesmo horário. Era do tipo brutamontes, daqueles que o rosto revela uma debilidade intrigante. Um verdadeiro homem das cavernas em pleno século XXI. Seus olhos eram do tipo que nos incita medo, olhos de um homem violento. Provavelmente era aquele brigão do ginásio que se fudeu na maioridade. Um inculto! Quase todos os dias que passava por ali e alguém o encarava de alguma forma, era um pretexto para que ele surrasse as pessoas. Não poupava ninguém. Um dia os olhos daquela vizinhança aprenderam a se dirigir para diversas localidades que não fossem aquele corpo troncudo e aqueles olhos que expunham uma intrigante sede de causar terror. Um típico macho primata, nada mais e nada menos do que isso. "O macho demoníaco"( apenas uma menção do estudo de Richard Wrangham e Dale Peterson).

Porém, havia essa mulher que não deixava de encará-lo. Dia após dia, surra após surra. Ela aguardava ansiosa a hora que aquele homenzarrão estaria ali naquele mesmo lugar, prestes a enfiar-lhe as mãos em seu corpo frágil e repleto de hematomas. Ninguém compreendia o por que de ela se sujeitar a isso. Não faziam nada para impedí-la. Imediatamente começaram a considerá-la louca. Nada menos natural do que isso. Um dia ela mal conseguiu se levantar para aguardá-lo naquela mesma rua. Mas foi mesmo assim. As pernas bambas, os olhos inchados, escoriações por todo o corpo. Nunca deixava de esboçar aquele lindo e contagiante sorriso. Por incrível que pareça, não havia nada de triste naquela boca aberta expondo aqueles lindos dentes. Era uma mulher linda e graciosa. Não devia ter deixado de mencionar isso. Nesse dia, ele não estava lá.

Ela aguardou, aflita, desesperada, vazia como uma xícara de café tragada por um viciado em cafeína. Nervosamente esvaziada. Esperou, e esperou, e esperou... Até que um dia seu corpo não podia mais se mover, só lhe restara os olhos da mente, de uma debilidade intrigante. Não perdurou muito tempo naquele drama inane. Na última espiada de seus olhos para o mundo que estaria a abandonar, viu aquele macho corpulento se dirigir a ela e sentiu um pisão em sua cabeça, não sem esticar aquela linda boca afetuosamente. Ele calçava um coturno preto.

I.B.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Diário de Nog (páginas perdidas II)


Houve um tempo em que olhar para o céu noturno me trazia a visão de estrelas e preenchimento. Um espetáculo de luzes cintilantes de uma beleza indescritível. Hoje é apenas o espaço. Repleto de vazios e vazios. Infinitas léguas de uma estrela para outra. Apenas um silêncio enjoativo e breu. Breu.

A boca de lobo - Quarto fragmento

Rolávamos violentamente de um lado para o outro. Parecia um combate, a batalha que enfim definiria o resultado daquela guerra. O bafo azedo exalava por todos os cantos daquele quarto escuro, os rugidos inebriados se desenrolavam longe daquela timidez usual. Pouco importava o que pensariam daquilo que se procedia, pouco importava o que não dizia respeito àquele quarto azedo e úmido. A umidade que era proveniente do intenso esforço físico, dos poros. As mãos mais se assemelhavam a garras, as pernas se contraíam progressivamente conforme os dois se projetavam um contra o outro. Era tudo de uma ternura varonil, típica dos famintos e insaciáveis. E tudo acabou em sangue e fezes.

I.B.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

A boca de lobo - Terceiro fragmento

-Fico indignado quando um cara vem nos roubar... Porra! A gente rala pra caralho pra comprar as nossas coisas e vem um filho da puta e nos toma o pouco que conquistamos com o nosso suor! E pra piorar, ás vezes nos enche de porrada ou até nos mete bala até estourar nossos miolos proletários!
-Hum...
-Respeito aqueles que roubam bancos. Ali sim! Estão tomando aquilo que não afetará o homem cotidiano. Eu, você, sua velha... Esses não deveriam ser chamados de ladrões!
-Seria o que então? Revolucionário?

Éramos amigos. Amigos que despercebidamente passeiam em suas próprias mentes sem ao menos perceber, conectos que são. Dividir um pedaço de minha existência com ele, era como agregar para mim um pedaço maior daquilo que chamo de existência. Não dividíamos em suma, multiplicávamos. Mas o resultado era sempre indivisível. Éramos um. Não havia pudor em uma relação tão intensa quanto essa, apenas nudez. Nudez entre duas crianças. Um dia desses enquanto estávamos deitados sobre uma caixa d'água abandonada olhando para as estrelas e tomando uns tragos, ele meteu um cigarro direto no meu olho direito. Aquele calor era infernal, a dor indescritível, nem tive condições de fitar seu rosto silencioso que me encarava com uma indiferença perturbadora. Era como se uma rocha estivesse a me encarar. Não. Não tive a capacidade de fazer qualquer consideração acerca do que me rodeava. Era tudo eu, era tudo dor. Nessas ocasiões, primeiro vem o sofrimento físico, depois o sofrimento da alma. E agora, há tanto veneno em minha alma que as pessoas me confundem com um animal peçonhento. Tenho tanto veneno em minha alma que me tornei uma cobra.

I.B.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A boca de lobo - Segundo fragmento

Não suportei ver a carinha daquele infeliz. Peguei a minha garrafa de vodka barata e taquei em sua cabeça. O sangue jorrou cabeça abaixo quase que imediatamente. Com metade da garrafa ainda em mãos, surrei novamente sua cabeça até que todo o vidro se despedaçasse em seu crânio. Não poupei nenhum pedaçinho da garrafa. Cheguei até a me cortar. Quando vi que o sangue que escorria em meu braço era meu, fui tomado de um frenesi que até eu me assustei. Peguei o primeiro paralelepípedo que encontrei naquela rua abandonada, quase que invisível, e arremessei contra seu tórax desprotegido. Foi penoso ouvir seus gemidos de intensa dor, até hoje não sei se o desgraçado bateu as botas. Mais penoso ainda foi ver a bebida escorrer em direção ao bueiro. Se não estivesse empapada de sangue...

I.B.

A boca de lobo - Primeiro fragmento

Atirei aquele cigarro que acariciava meus lábios e rasgava a minha garganta, sorvia meus pulmões. Ressequidas baforadas vieram em seguida, acompanhadas de uma tosse lancinante que mutilava minhas cordas vocais. O sangue escorria pela minha boca fétida, os dentes enegrecidos de sangue coagulado, a boca seca. As gengivas passaram a latejar, a pulsar como um ser com vida. Caí de joelhos sobre o asfalto esburacado. Havia chovido a pouco. Olhei-me na poça e não reconheci o que vi. Um líquido pastoso, de cheiro horrível e enegrecido pôs-se a gorgolejar agora das minhas entranhas, das vísceras. Os olhos amarelados de uma languidez ofensiva, esbugalhados, quase a saltar para fora das órbitas. Ainda assim, podía-se distinguir a pureza de suas matizes, intacta... Só fui estuprado por uma centena de maços!

I.B.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Caixa Preta


- O balanço se punha a oscilar hipnoticamente enquanto eu mal tinha tempo de compreender o que se passava. Sentia no peito aquele preenchimento que nos embriaga, sabe? Havia duas pessoas do meu lado. Um deles de sorriso cativante, daqueles que nos aquece a alma, o outro de uma gargalhada que beirava ao patético, mas uma pateticidade que nos remete à nobreza, entende? E foi um dos momentos mais felizes da minha vida. "E você estava lá. Você estava lá".

- Entendo. Fico imaginando como deve ter sido esse dia. Não há nada mais de que se lembre?

- Nao é necessário. Nada mais me é. Só precisava desse momento para me recordar das coisas importantes que o tempo levou. Decidi escolher justamente essa lembrança, pois ela me prometia um mundo vasto e destituído de dor. As outras estão no quarto empoeirado logo ali. Mas, nem por isso deixam de ser preciosas. Elas até me dizem mais.

- Não me atrevo nem a espiar pelas frestas. Me é doloroso fitar esse tipo de coisa.

- Você já amou?

- Não existe tal elemento em minha composição. Não há espaço para isso.

- Mas, você pode sentir dor?

- Minha dor chama-se inveja.

Eis que me acordo ensopado em suor. Meu corpo estremecia aterrorizado pelo que acabara de presenciar na minha inconsciência. Mas, que indivíduo mesquinho era aquele a dialogar com... não era comigo! Eu não via a mim naquele sonho. Não! Absolutamente não! Não pude ver a face daqueles que conduziam-me naquele diálogo. O que fazia eu lá? Nada daquilo me era familiar. Mas, aquelas palavras, "e você estava lá. Você estava lá", eram nitidamente dirigidas a mim. O que isso quer dizer? Quem é você? Me responda! Não me deixe a sós com essa dúvida assaz angustiante. Eu quero me lembrar! Não me fujam assim sem aviso prévio. E quem era aquele senhor a falar? Existia algo de grandioso naquele indíviduo. Algo maior do que a minha reles existência, mas de alguma forma, de uma carência mórbida, inexprimível. Quando vamos nos reencontrar?

I.B.

Nove dias

Duas crianças se encontraram certo dia, os olhares tímidos não escondiam a avidez de seus corações, corações inflamados de ideais e sonhos sob perspectivas alheias, que partiam de pontos diferentes e convergiam no mesmo ponto. Uma delas estava ansiosa para mostrar as belezas de seu lar, a outra para aprender o máximo que podia e regressar para seu longínquo país. O vento cochichava para as árvores enquanto eles percorriam as estradas úmidas e cantarolantes da terra onde o Sol dorme sobre. Ás vezes o silêncio se apresentava como um livro de milhares de páginas e as crianças continuavam a andar, contemplando cada pedaço de vida que ocorria naquele momento em todo o mundo. Mas para eles, em seu microcosmo, em seu jardim de mangueiras e cajueiros, todo o mundo se apresentava ali naquele instante, uma barreira impenetrável os protegia daqueles olhares examinadores e julgamentos mesquinhos que estavam habituados a conviver eras antes. As crianças foram felizes em um milésimo de segundo de existência, e os olhares tímidos e impenetráveis revelavam a dor da despedida. Mas eles sempre conheceram essa condição, tive que aprender a aceitá-la (embora nunca compreender). As crianças tinham uma outra vida para viver, em outro lugar, outros ares, cercadas pelos reflexos desfigurados do homem: as sombras. Estariam acolhidas em uma outra realidade, aonde seus corações inflamados, não passam de pulmões sufocados. Mas, cada um havia presenteado o outro com seu calor e com um pedaço do espaço. Toda vez que o pequenino anfitrião olhar para sua lua, ela estará olhando também. O mesmo céu em terras diferentes. E é isso que os mantêm ligados desde o início, através de seus olhos tímidos e gargalhadas vigorosas, nós sempre tivemos o mesmo céu...

“Verde”


10/08/07


Val

Tear me down

Tear me down 'cause I do flee my fellowmen
Tear me down for I have written in my skin
'Cause I'd better followed every words but yours
I'd like to know the right way for no love

Hold me tight with your censorship
When I fade away I use to bleed
My words are children of this
My poetry is tired now

Maybe when we pass away
We're gonna win all those days
When the love was a game
And all the feelings were deadly pain

Love was a game

I had to be so valiant enough to face up to the people blindness
I wrote myself a bible
But I didn’t spill my guts yet for you
I had this tuned in something minor

So hold me tight with your censorship
So I’ll try to keep a straight face
My words were children of this
This poetry is tired now

(...)

Felipe Maia

domingo, 6 de setembro de 2009

I could have lied

Deve haver algo
Na maneira como eu me sinto
Que ela não quer que eu sinta
Seu olhar cortante me despe
Eu não me importo
E daí se eu sangrar?

Eu nunca poderia mudar
O que eu sinto
Minha face nunca mostrará
O que não é real

Uma montanha nunca parece
Ter a necessidade de falar
Um olhar que compartilha tanta procura
O sentimento mais doce
Que obtive de você
As coisas que te disse eram verdade

Eu nunca poderia mudar
O que eu sinto
Minha face nunca mostrará
O que não é real

Eu poderia ter mentido, sou um grande tolo
Meus olhos nunca nunca nunca poderiam
Manter-se gélidos
Mostrei e contei à ela como
Ela me fisgou e estou ferido agora

Mas agora ela se foi, sim ela se foi
Uma profunda canção
Que não tardaria
Veja que ela se esconde por que está apavorada
Mas, eu não me importo
Eu não serei poupado

Eu poderia ter mentido, sou um grande tolo
Meus olhos nunca nunca nunca poderiam
Manter-se gélidos
Mostrei e contei à ela como
Ela me fisgou e estou ferido agora

Eu poderia ter mentido, sou um grande tolo
Meus olhos nunca nunca nunca poderiam
Manter-se gélidos
Mostrei e contei à ela como
Ela me fisgou e estou ferido agora

(Tradução de I could have lied do Red Hot Chili Peppers)

sábado, 5 de setembro de 2009

Olho de tolo (páginas perdidas)

Aqueles olhos imitaram os olhos que já se deitaram sobre os meus, e as pernas brincavam com as pernas alheias da mesma maneira com que prometeram-me seus gracejos. Eu funcionava meramente como um telespectador e só me restava o controle remoto. Para que continuar a mirar aquele espetáculo que só cutucava meu calo palpitante? Joguei fora a televisão! Pois ela perdera a genuinidade de que fora concebida. Os fatos passaram a se desenrolar visando uma exposição direcionada. Aqueles olhos são uma imitação de uma verdade há muito perdida. Mas, por que tinham que cantar necessariamente da mesma maneira? Será que eu fui incapaz de nadar em sua íris de matizes cintilantes? Acordo todos os dias com um bom dia invisível na beirada da minha alma. Asco! Asco! Asco!

Throw away your television
Time to make this clean decision
Master waits for its collision now
Its a repeat of a story told
Its a repeat and its getting old

São as vozes que ecoam na minha cabeça. Muitas vozes ecoam na minha cabeça. No divã só nos resta um momento de estaticidade dinâmica. Daqueles provenientes de algo que não se fabrica nas suas engrenagens nervosas. Isso não é saudável. Estender-lhes a face a cada milésimo de segundo, sendo bombardeado por granadas. Empunhei meu coquetel molotov como um bom guerrilheiro que sou e afundei-lhe a cara! Ops! Aonde foi aquela poesia toda? Parem de me dizer o que fazer! Por mais sincero que isso pareça! Vocês são meros demônios e demônios se desfazem como poeria em um vendaval. Espalham sua composição suja por aí. Um dia vocês se calam seus malditos mal amados!

Renegades with fancy gauges
Slay the plague for its contagious
Pull the plug and take the stages
Throw away your television now

Oh, lindo alfarrábio de alcunha feminina. Só posso amar-te agora. Mas quando folhear-lhe as laudas até a última delas... Não terás nada a me dar? Um dia te deixarei em uma portaria para alguém mais te amar. Vou vestir-lhe o corpo castanho e esconder-lhe as inscrições douradas. Não quero que inveja sintam de tua couraça. Oh, lindo alfarrábio, onde estariam teus cachos?

Estava dentro de uma cápsula hermeticamente lacrada. Imaginava uma situação nostálgica. Todas as nuances de um dia que se foi apareciam diante de mim. Não ouso repetir as palavras que me lembrei, mas ainda pulsam. Adoro cheiro de carne viva. Me banhe em sangue, sangue meu. Só tolero sangue. Meu. Ouvi um doce assobio, mas não era de um pássaro. Era tão distante... Não podia responder-lhe. O gás começou a ser expelido por canos que haviam em todos os cantos. Não tive tempo nem de...

Alguém