sábado, 1 de novembro de 2008

Humanidade Divina

Ela tinha os olhos negros e profundos, como um lago de águas frias e escuras, que escondem segredos inominados e inimagináveis lá onde a vista, nem a luz, nem ninguém jamais conseguiria chegar. Segredos que restavam adormecidos no fundo do lago, sem a menor pretensão de acordarem e revelarem-se. Segredos que nunca seriam descobertos, por quem quer que fosse.

A frieza daqueles olhos negros perfurava o coração dos fracos, massacrando-os, fazendo-os desviar o olhar, sem suportar o medo que lhes dominava o coração. Mirá-los era ato de bravura, para poucos. Era, porém, compensador. A negritude e a frieza daqueles olhos escondiam uma ternura guardada a sete chaves no fundo do seu coração, uma vontade, quase desespero, de amar e ser amada, de proteção, de braços fortes que, envolvendo-a e apertando-a junto ao corpo, fizessem sucumbir a fortaleza de gelo com a qual se envolvera e se guardara. Aqueles olhos austeros escondiam uma vulnerabilidade que ela preferia não revelar.

Sobre os ombros, negros cabelos lhe escorriam, ondulando como as ondas de um mar noturno a refletir a claridade pálida da Lua. Cabelos que cheiravam ao doce perfume das rosas do jardim celestial, que enfeitiçavam qualquer um que deles pudesse vir a ter notícia. Cabelos que brilhavam um brilho indefinido, como indefinido é o brilho dos deuses.

Bem aventurados aqueles que de sua voz suave puderam, ao menos uma vez na vida, ouvir a melodia, a qual nos transporta para um mundo outro, atemporal, onde nada passa, tudo continua, estático, sempre, a não ser a sua voz que vai e vem num ritmo doce e hipnotizante. Sua fala é a fala dos deuses. É música o que emite, não palavras. É o mais puro amor, contido, porém, ansiando por explodir e, ao mesmo tempo, sem coragem de fazê-lo.

Sua pele, branca e lisa, possui o mais delicioso aroma. Quente, arde uma chama ali dentro que não se deixa apagar. Mas também não se deixa mostrar completamente.

É humana, porém, não me resta dúvida. Apesar de tudo é humana, ela guarda dentro de si o calor da vida, que se renova a cada novo gole de ar que toma emprestado dos céus. Como humana, ela sabe sofrer, ela sabe chorar por amor. Em sendo deusa não o faria. E é essa humanidade em corpo e nobreza dignos de deuses que apaixona a todos que deitam os olhos sobre ela. Foi essa humanidade divina que me apaixonou e me apaixona todos os dias. É essa mulher, mais próxima dos deuses que qualquer outra pessoa nesse mundo, que eu amo perdidamente e sempre vou amar. Mesmo quando não houver mais vida nesse corpo, meu pensamento irá amá-la.


P.M.