segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

O telefone


Recebi um telefonema, mudo. Esperei... mudo. Mudo. Adormeci naquela casa só, naquela cama larga de casal, só. Sozinho. Acordei no meio da noite e fui à geladeira, vi algo horripilante dentro dela, "deve ser um pesadelo". Quantas moscas na cozinha... Me deitei no sofá encardido e ouvi o miado dos gatos do lado de fora, provavelmente no cio. A casa toda fedia à carniça. Liguei a tevê com o controle remoto. Pornô, filmes repetidos, talk-shows... Cadê os desenhos? Era tarde... não havia desenhos essa hora. Merda! Cadê os desenhos? O QUE FIZERAM COM OS DESENHOS!? Desliguei a tevê... Abri a janela para ver a rua. Estava frio. Abri a porta e saí de samba-canção. Era florida. Flores vermelhas. Adorava vermelho, vermelho-sangue, vermelho de sangue. Minhas mãos estavam sujas de sangue... Mosquitos também devem gostar, já que sugam ele. Os carrapatos também. O sangue. Me sentia com várias patas, desengonçadas, é difícil andar com tantas patas... Esperei algum farol iluminar aquela pista escura, que frio... frio. Ouvia os grilos e ainda ouvia as moscas, tantas moscas. Eu vi o caminhão se aproximar... estava quase chegando... me joguei na frente. O telefone tocou.

(quadro de Van Gogh)
I.B.