segunda-feira, 27 de abril de 2009

"Uma vez alguém me disse algo sobre o despertar ser o momento mais perigoso do dia. Essas palavras ficaram inscritas em mim como as escrituras de uma lápide. Foi Kafka quem lhe disse isso. E agora eu digo a vocês."

"Uma vez fui acusado de chorar".

Usavam máscaras carnavalescas semelhantes às máscaras venezianas. Cada um dos três estava trajado em um terno negro de listras brancas. Foi a primeira coisa que vira quando acordei. Murmurei algumas palavras sem sentido decorrentes do meu recente despertar, ainda confundido com o sono e tentei me levantar. Um dos homens me empurrou de volta à cama e sem pronunciar uma só palavra algemou meus pulsos. Fui arrastado escada abaixo do meu minúsculo apartamento enquanto os vizinhos me encaravam surpresos. Ninguém moveu um dedo sequer para me ajudar, eram cúmplices daquilo tudo e nada faziam. Me jogaram na mala de um carro de luxo negro. Breu. A escuridão que sufocava meus olhos, passou a sufocar meus pulmões. O carro estava em movimento e pareceu uma eternidade o tempo que passei lá dentro daquela masmorra comprimida. Estava em posição fetal com as mãos, os olhos e os pulmões atados, aguardando o momento em que meus carcereiros me tirariam dali e me levariam para o próximo círculo do inferno. O carro parou. Segundos depois, uma luz intensa me cegou temporariamente, era o sol da manhã. Estávamos no topo de uma colina e me empurraram direto para a beirada daquele precipício que se lançava sobre o mar. Prenderam minhas pernas à uma pedra que pesava uns 50 quilos e me jogaram sem ao menos uma cerimônia ou algo do tipo. Nunca cheguei a ouvir a voz de meus executores e muito menos a sentença do juiz, mas não poder inspirar e expirar o ar de nossos pulmões é um castigo muito pior do que esse. A água começa a invadir suas narinas e penetrar a sua garganta, obstruindo toda a passagem de oxigênio. A dor é extenuante e parece que nunca cessará. Foram apenas míseros minutos, mas asseguro-lhes que se apresentaram para mim como anos. Porém, sempre me encantei com o oceano, ao menos eles me legaram isso. Que gesto nobre da parte deles.

I.B.

Um comentário:

ra.quel passos disse...

sufocante. Mas a beleza do oceano não é menos sufocante que a descrição desse texto..